12 novembro 2014

Eu que já gostava do Paulo..



A lição de bons modos que Alckmin deu a Míriam Leitão
O déficit civilizatório de Míriam Leitão
Meu pai, Emir Macedo Nogueira, estudou latim.

Era um conhecedor profundo do português. Durante anos, ele manteve na Folha de S. Paulo uma coluna chamada A Língua Nossa de Cada Dia, em que abordava o português do cotidiano das pessoas.

Papai costumava dizer que a língua portuguesa é, acima de tudo, generosa. Há poucos pontos em que ela é irredutível, e não dá alternativas a quem a usa.

Lembro que certa vez, muitos anos atrás, meu pai falou sobre o uso de presidente ou presidenta para a líder argentina Isabelita Perón.

As duas formas, explicou meu pai, são aceitáveis e defensáveis, e ali estava um pequeno exemplo da generosidade do português.

Fiz este introito porque soube, por meu irmão, que Míriam Leitão, numa entrevista, encrencou com Alckmin porque ele se referiu a Dilma como “presidenta”.

Míriam Leitão, que até então cumulava Alckmin de sorrisos e engoliu passivamente todos os números que ele lhe enfiou para tentar explicar a seca de São Paulo, ficou brava com o “presidenta”.

Segundo ela, quem chama Dilma de presidenta é petista. Me pareceu que ela fez uma careta ao falar “petista”, mas pode ter sido impressão apenas.

Alckmin, com sua mediocridade simpática e sorridente, se saiu muito bem. Disse que chama as pessoas como elas gostam de ser chamadas.

Se a série confusa de estatísticas que ele apresentou para Míriam Leitão não resolve a falta de água dos paulistas, sua atitude civilizada ao explicar por que “presidenta” merece aplausos.

Míriam Leitão, em compensação, faz jus a vaias de pé.

Se a língua portuguesa é generosa, como falava um dos jornalistas que a conheciam com mais profundidade, Míriam Leitão mostrou pequenez e mesquinharia.

Os jornalistas que decidiram chamar Dilma de “presidente” têm, vamos ser francos, razões muito mais ideológicas do que vernaculares.

Eles são mais versados no “odiojornalismo”, para usar a expressão da pesquisadora Ivana Bentes, do que no português.

Não estão protegendo a língua com o “presidente Dilma”. Estão atacando Dilma, gratuita e maldosamente.

Imagine, apenas a título de exercício, que a mulher de Roberto Irineu Marinho assume a presidência da Globo.

Pense agora que ela gostaria de ser tratada como “presidenta”.

Como Míriam Leitão se dirigiria a ela?

Fiquemos em Roberto Irineu. Digamos que ele queira que o tratem não como presidente da Globo, mas como CEO. E então, como os bravos jornalistas da Globo se refeririam ao chefe? Numa confusa justificativa, Míriam Leitão disse que “presidente Dilma” é “mais normal” que “presidenta Dilma”.

E “CEO Roberto Irineu Marinho”, caso ele decidisse adotar esse título: é “menos normal”? Míriam Leitão, em nome dessa abstrusa normalidade, insistiria em dizer “presidente Roberto Irineu”?

Alckmin deu uma lição de boas maneiras não apenas a Míriam Leitão, mas a todos os jornalistas que só chamam Dilma de “presidente” para importuná-la.

Faltam bons modos a eles – e também conhecimento de português para sustentar seu déficit civilizatório.

Postado no DCM em 11 nov 2014 por: Paulo Nogueira